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AETERNUS – o novo topo de gama da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo

 

Créditos – Grupo Amorim

O AETERNUS é o novo topo de gama da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo. Trata-se de um tinto que sairá para o mercado apenas em anos considerados de excepcional qualidade. A edição inaugural é da colheita de 2017, ano do falecimento da pessoa que o mesmo pretende homenagear – Américo Amorim.

Com o lançamento deste vinho, o Grupo Amorim visou não só fazer um tributo ao seu maior impulsionador, como também assinalar os 20 anos de presença da família Amorim no sector dos vinhos. A Quinta Nova foi adquirida em 1999, sendo na época propriedade da Burmester – empresa/marca entretanto vendida à Sogevinus.

Empreendedor nato, empresário notável e figura de proa da economia nacional, para além da família, era no Alentejo que Américo Amorim tinha o seu porto de abrigo. A extensão, a temperatura e a languidez daquela região mexiam com ele. O Alentejo proporcionava-lhe a paz que o permitia relaxar e pensar, como também a energia que o fazia crescer e evoluir. Tinha com aquela região uma relação quase umbilical, já que era nela que, maioritariamente, se desenvolvia a origem do negócio da sua família – o montado de sobro! No entanto, era também um apaixonado pelo Douro, pelos socalcos da vinha centenária e pelos quilómetros de muros de xisto que enriqueceram a região ao longo dos tempos. Melhor do que ninguém, sabia dar valor ao trabalho hercúleo existente por trás de todo aquele excesso de natureza – nas palavras de Miguel Torga. Não conseguiu ficar indiferente à beleza da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo e nela encontrou a concretização de um sonho antigo – a produção de vinhos de qualidade superior.

Foi na Fundação Albertina Ferreira de Amorim, em Mozelos – Santa Maria da Feira, lugar onde nasceu e cresceu Américo Amorim, e casa onde ainda hoje a família se reúne para passar o Natal, que Luísa Amorim (a sua filha mais nova e a responsável pelos negócios familiares no sector dos vinhos), recebeu a imprensa para o lançamento deste vinho de homenagem.

No âmbito de um discurso emotivo, do qual gostámos tanto ao ponto de lhe pedirmos que o partilhasse posteriormente connosco, deu-nos a conhecer um pouco mais daquilo que foi a vida do seu pai, enquanto homem e empresário.

Créditos – Grupo Amorim

O nome não poderia ter sido melhor escolhido. AETERNUS – faz jus a um homem que se imortalizou através do seu legado. Não daquele que deixou aos seus herdeiros, mas aquele que deixou a todos nós, Portugueses. Um exemplo que englobará sempre uma enorme capacidade de trabalho, uma grande noção estratégica, uma gestão competente e uma combinação quase extranatural entre visão e intuição. Mais do que a capacidade de investir em certos negócios, admirar-lhe-ei sempre a capacidade de sair, na altura certa, de outros tantos.

AETERNUS possuí também o A de Américo, o A de Amorim e relembrará sempre uma das suas frases ou observações mais marcantes e até polémicas: “Às vezes falam-me da minha sucessão e eu digo – sou eterno”. Claro que ele sabia que não o era enquanto ser terreno, mas também não ignorava que tinha conquistado esse lugar no mundo dos negócios. Irão passar várias décadas, senão mesmo séculos, até aparecer outro Américo Amorim na história de Portugal.

E por falar em história, a família/Grupo Amorim não tem uma longa existência no mundo dos vinhos, mas registou nele já alguns méritos. Reconheço-lhe pelo menos dois. A saber:

1 – O Grupo Amorim é um, se não mesmo o maior responsável pelo incremento do enoturismo de qualidade na região vinhateira do Alto Douro. E olhem que eu não sei isto meramente por ler em jornais ou revistas. Sei isto por experiência própria. Comecei a fazer enoturismo numa altura em que não havia nada…ou praticamente nada no Douro e, menos ainda, noutras regiões do país. Por essa razão, sei exactamente o que representa a Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo no âmbito do enoturismo.

2 – Elaboração de vinhos de qualidade e posicionamento em conformidade. Encabeçar a produção de vinhos de qualidade e saber posicioná-los de forma adequada, não estará ao alcance de qualquer um. Ao fazê-lo, prestam não só, como também, um bom serviço a Portugal enquanto país produtor de vinho. Chega de “vender” Portugal como produtor de vinho barato. A qualidade é algo caro, em Portugal ou em qualquer parte do mundo, no sector do vinho ou noutro qualquer.

Se existirem empresas que consigam catapultar Portugal para este patamar de reconhecimento internacional de valor e, consequentemente, de preço… só teremos mesmo é que agradecer.

Créditos – Grupo Amorim

O ano de 2017 foi um ano extremamente quente e seco, durante o qual a evolução das condições climáticas teve como consequência o adiantamento significativo do ciclo vegetativo, fazendo com que a vindima tenha sido uma das mais precoces de que há memória. A ausência prolongada de chuva e as temperaturas elevadas até Junho tiveram grande impacto nas vinhas, levando a perda de produção, nomeadamente pela desidratação ocorrida nos cachos, conduzindo a um aumento da concentração.

O perfil clássico do AETERNUS 2017 denota a robustez das castas autóctones, “a rugosidade do tempo e a persistência da mão humana na construção dos ditos quilómetros de xisto – que Américo Amorim comparava à muralha da China”.

“Portanto, achámos que se tivéssemos de fazer uma homenagem teria de ser exactamente com este vinho, por aquilo que o meu pai significava como pessoa e por aquilo que este vinho também significa para nós” – disse Luísa Amorim.

Com a Natureza a mostrar toda a sua imprevisibilidade, foi preciso convocar a larga experiência da equipa de enologia e viticultura da Quinta Nova, liderada pela dupla Jorge Alves e Ana Mota (enólogo e viticultora) que, no momento certo, soube intervir e fazer frente a uma das vindimas mais difíceis de sempre.

No entanto, o resultado foi surpreendente, sendo este AETERNUS um bom exemplo disso. Um vinho de enorme concentração, complexidade, suave textura, com excelente frescura e grande persistência. Foram produzidas pouco mais de 3500 garrafas e o seu PVP é de 140,00€. Um presente de natal seguramente memorável para qualquer amante de vinhos!

Olga Cardoso

Artigo publicado inicialmente no site Wine & Stuff 

Herdade Aldeia de Cima
Herdade Aldeia de Cima – A kind of magic!

Herdade Aldeia de Cima

A Herdade Aldeia de Cima é uma propriedade de grande dimensão, com uma enorme extensão de sobro e azinho, ou não se tratasse de uma herdade de montado.

Em 2017, Luísa Amorim e o marido, Francisco Teixeira Rêgo, decidem recuperar um complexo de casas e edifícios agrícolas devolvendo vida a um lugar situado precisamente na fronteira entre o Alto e o Baixo Alentejo dando então origem a Herdade Aldeia de Cima.

Uma boa parte da Serra da Mendro (cerca de 1750 hectares) estão incluídos na propriedade que se divide por dois concelhos e dois distritos. Parte da herdade está situada em Portel, distrito de Évora (onde está localizada a adega) e outra parte está situada na Vidigueira, distrito de Beja, onde se encontra a maior parte da vinha. Uma curiosidade que contribui muito para a sua diversidade e peculiaridade.

A Luísa conhecia bem este Alentejo diferente, por onde foi tantas vezes conduzida pela mão do seu pai Américo Amorim, e lembrava-se bem também dos frescos e sedosos vinhos alentejanos anteriores à invasão das castas internacionais.

O gosto por estas terras e por este perfil de vinhos ia dando lugar ao sonho de aqui produzir os seus próprios vinhos, plantando vinhas em áreas da herdade que não possuíssem sobreiros. Queria plantar castas típicas ou perfeitamente adaptadas à região, mas queria plantá-las também em altitude, tirando partido das boas características que daí se podem obter. Uma espécie de inovação na continuidade.

E foi nessa sequência que desafiou Jorge Alves a fazer uns vinhos com forte tipicidade alentejana, texturados e frescos, com castas típicas e com recurso a uma enologia que permitisse exprimir correctamente o terroir, uma enologia que “deixasse falar a região”.

Se a experiência corresse bem, partiria para a construção de uma adega através da recuperação de um antigo armazém, preservando assim a arquitectura típica do local e para a plantação de vinha.

Herdade Aldeia de Cima

Com a ajuda de produtores amigos e vizinhos (Cortes de Cima e Rocim) meteram mãos à obra e produziram os seus primeiros vinhos, com uvas provenientes de parcelas situadas em Estremoz, Portalegre e Vidigueira. A experiência não poderia ter corrido melhor e o sonho de Luisa começava a ganhar forma.

Era tempo de desenhar e plantar as vinhas. Foram projectadas 4 vinhas, duas para 2019, a Vinha dos Alfaites – no ponto mais alto da Serra do Mendro (cerca de 400 metros) e a Vinha da família no Planalto do Mendro em Santana, com apenas um hectare e mesmo à entrada da adega, em vaso, e só e com castas mais tradicionais, tais como, Diagalves, Moreto, Perrum, Tinta Caiada, Tinta Miúda, etc..

Para 2020 estão pensadas mais duas vinhas. A Vinha de Sant’Anna, com 2 hectares e as castas Roupeiro e Perrum, e a Vinha da Aldeya, também ela situada em Santana, com 4 hectares e as castas Antão Vaz, Arinto, Alvarinho e Aragonês. Nesta herdade não existe planície, mas tão só planalto e serra.

A Vinha dos Alfaiates foi a primeira a ser plantada e aquele relevo acidentado, atravessado pela Ribeira dos Alfaiates, inspirava à implantação de um modelo único e singular no Alentejo. Falamos de 14 hectares de vinha cultivada em função das curvas de nível do solo, com declive de 30 a 40% de altitude, cotas de 300 a 390 metros, exposições solares ideais e uma amplitude térmica invulgar, essencial para imprimir frescura ao vinho. As castas escolhidas foram a Trincadeira, o Alicante Bouschet, o Antão Vaz, o Aragonês, o Alfrocheiro e um bocadinho de Baga.

A Baga e o Alvarinho previstos para os encepamentos, foram pensados em pequenas quantidades e apenas para corrigir lotes.

Esta é assim a primeira vinha em patamares tradicionais de 1 bardo no Alentejo, que usufrui de uma panorâmica estonteante entre o Alto e o Baixo Alentejo. É algo de muito improvável que se tornou realidade. É caso para dizer que o impossível se realizou. Quem alguma vez ousou pensar em vinhas em patamares no Alentejo? Pois é…“Deus quer, o Homem sonha, a obra nasce”!

Herdade Aldeia de Cima

O passo seguinte foi a construção da adega, tendo terminado mesmo a tempo desta última vindima de 2019. É uma adega destinada à produção de 100 a 120 mil garrafas ano e equipada com diferentes depósitos para fermentação e estágio, como barricas de carvalho francês de 500 lts, balseiros, turtle tanks (ânforas moldadas em pó cerâmico sobre uma estrutura de fibras naturais) tinajas em terracota e cubas em cimento Nico Velo.

Aqui procura-se qualidade em detrimento da quantidade. Procuram-se texturas, mineralidade dos solos, antiguidade, história e tradição.

Marcada pelo encontro entre o passado e o futuro, esta adega pequena, simples e funcional, instalada num edifício tipicamente alentejano, vai proporcionar uma enologia de intervenção mínima, onde se pretende evidenciar a complexidade e heterogeneidade dos solos e o diferente carácter das micro parcelas e castas.

Para quem já visitou esta herdade, e eu tive a sorte de lá ter estado no âmbito de um evento que nunca mais irei esquecer, tal era a alegria contagiante e energia positiva que emanava de toda a equipa, é fácil perceber todo o encantamento e felicidade que envolvem este projecto.

Estar no cimo daquela vinha em patamares na Herdade Aldeia de Cima, com Beja no horizonte e Vila de Frades mesmo ali aos pés, foi um momento verdadeiramente desconcertante e repleto de magia. Foi um momento tão mágico que eu só me lembrava da música dos Queen – A kind of magic – “One dream, one soul, one prize, one goal…”.

Mas os momentos mágicos não se iriam ficar por aqui. De regresso à casa principal da herdade, fomos recebidos por um grupo de Cante Alentejano que cantou para nós sob um pôr do sol maravilhoso enquanto o José Avillez nos preparava uns finger food deliciosos e provávamos o Aldeia de Cima Reserva Branco 2017. Foi um momento tocante.

Os restantes vinhos foram servidos durante o jantar, também ele muito especial. Tudo muito bem organizado. A qualidade na simplicidade.

Este é um projecto que vou querer seguir de perto. Espero com ansiedade pelos vinhos produzidos com uvas desta herdade, que se esperam lá para 2023 ou 2024. A ver pelos que estão a ser produzidos com uvas provenientes de parcelas situadas fora da herdade, pela qualidade da equipa e a genuinidade que envolve todo o projecto, certamente que irão ser grandes vinhos. Herdade Aldeia de Cima…I have a crush on you!

Herdade Aldeia de Cima

Aldeia de Cima Reserva Branco 2017 – Produzido a partir das castas Arinto (33%), Alvarinho (33%) e Antão Vaz (34%), provenientes da Vidigueira, este branco apresenta um nariz com notas de citrinos maduros, flor de laranjeira e ameixa branca. As notas provenientes da madeira são muito suaves, dado que os nove meses de estágio em barrica ocorreram maioritariamente em madeira usada (80%). Na boca a suas notas varietais também se fazem sentir, nomeadamente a casca de laranja. Destaca-se a sua forte untuosidade e largura de boca, tornando-o num vinho cheio, redondo e harmonioso.

Aldeia de Cima Reserva Tinto 2017 – Feito a partir das variedades Trincadeira (40%), Aragonez (30%) e Alfrocheiro (30%) e com uvas vindas de parcelas situadas na Vidigueira, Estremoz e Portalegre, este tinto permite-nos imergir completamente no Alentejo. Estagiou em diferentes tipos de depósitos como barricas de carvalho francês de 500lts, 30% usadas e 20% novas, 30% em cimento e 20% em tinajas de barro. Seco, suave e sedoso, revela a fruta em perfeita combinação com as notas de especiarias. Complexo e elegante, possui grande finura de boca e um bom caracter gastronómico. Um belíssimo exemplar alentejano.

Alyantiju Branco 2017 – Um vinho de tese nas palavras de quem o fez e eu concordo inteiramente. Trata-se de um extreme de Antão Vaz vindimado no momento certo, depois da espera pela maturação aromática e fenólica. Fermentou em barricas novas de carvalho francês de 500 lts, durante 9 meses. O nariz ainda se mostra algo fechado e revela evidentes notas tostadas. Pimenta branca, citrinos maduros e pedra molhada também se fazem sentir. Na boca é uma verdadeira explosão de prazer. A sua amplitude e profundidade, em conjunto com a sua frescura e a sua acidez vibrante conferem-lhe uma prova de boca marcante e colossal. Eu não sou muito fã de vinhos com uma presença da madeira tão notória, mas não consegui ficar indiferente a este Antão Vaz pleno de charme e elegância.

Alyantiju Tinto 2017 – Produzido exclusivamente a partir da casta Alicante Bouschet este tinto remete-nos para um Alentejo intemporal e sofisticado. Mostra-se preto e opaco, quase impenetrável à luz. Vivo nos taninos, bastante especiado e generoso na acidez, tem tudo para se converter num sedutor nato, capaz de entusiasmar desde o primeiro momento. Um dos seus melhores vinhos de sempre, nas palavras de Jorge Alves, é um Alicante Bouschet complexo, profundo e desconcertante. Poderoso e tenso mas simultaneamente macio e sedutor. O final de boca marca pela frescura quase inacreditável e pela sua pujante persistência.

Olga Cardoso

Um texto publicado inicialmente no site Wine & Stuff

QUINTA NOVA de Nossa Senhora do Carmo

Qualidade, Rigor e…Un Petit Quelque Chose!

O nome da Quinta não é só Quinta Nova, como vulgarmente é conhecida, mas sim – Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo. Um nome um bocadinho grande, é certo, e que se prende sempre a algumas dúvidas e questões junto dos diferentes visitantes. Uma vez chegados à Quinta e olhando para a fachada da sua histórica adega, que exibe a data de 1764, todos os meus enoturistas – nomeadamente os brasileiros – invariavelmente perguntam como é que a Quinta se chama Quinta Nova se na realidade é do século XVIII?!

A resposta é simples. A Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo nasceu na primeira metade do século XVIII, e é o resultado da junção de duas velhas quintas. Dessa junção de duas velhas quintas, surgiu uma nova quinta e daí o nome Quinta Nova. A designação Nossa Senhora do Carmo relaciona-se com a Santa Padroeira da capela localizada na propriedade junto à margem do rio Douro. Naquela perigosa zona do rio, os tripulantes dos barcos rabelos eram vítimas de frequentes naufrágios, suplicando pela protecção daquela santa. Assim, e na sequência de uma promessa dos mareantes, foi construída a pequena capela, albergando uma imagem em pedra daquela padroeira e renomeando a propriedade para Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo.

Nas mãos da família Amorim desde 1999, esta propriedade é actualmente gerida pela 4ª geração da família, designadamente por Luísa Amorim. A Luísa é uma das grandes responsáveis pelo incremento do enoturismo no Douro e futuramente noutras regiões vitivinícolas nacionais também. A Quinta da Taboadella no Dão, iniciará a sua actividade em 2020 e será certamente uma lufada de ar fresco para uma região que necessita imenso de sangue novo, empreendedor e esclarecido. No entanto, as novidades não se ficarão por aqui. Outros projectos e outras regiões irão surgir em breve e disso darei futuramente a devida nota.

Desta vez irei apenas falar de 4 topos de gama da Quinta Nova. Tenho, desta feita, a minha tarefa completamente facilitada. Em breve sairão dois outros artigos, mas de momento, são mesmo os topos de gama disponíveis no mercado que prendem a minha atenção.

Antes de passar à descrição dos vinhos, impõe-se dizer que o enólogo da casa, o simpático e carismático Jorge Alves, foi este ano considerado o melhor enólogo do ano, ex-aequo com o seu amigo e sócio – Celso Pereira, pela Revista Vinho Grandes Escolhas.

QUINTA NOVA ROSÉ RESERVA 2017 (PVP +/- 17€)

Na cor apresenta-se de um rosa pálido, um tom a fugir para um salmonado intenso, à semelhança de muitos dos bons rosés franceses de La Provence. O seu aroma é complexo, com notas de pedra molhada, framboesas, groselhas e demais frutos silvestres. Notas a morangos frescos são também bastante evidentes. A sua prova de boca é uma mistura de frescura com sofisticação, fazendo dele um dos melhores rosés nacionais. Apresenta um corpo robusto, com uma acidez correcta, associado a uma delicadeza e um equilíbrio notáveis. Um rosé ambicioso, requintado e com forte cariz gastronómico, fazendo assim toda a diferença numa mesa que o mereça.

MIRABILIS BRANCO 2017 (PVP +/- 42€)

Com uma cor amarela cítrica intensa, este branco duriense revela uma enorme grandeza aromática. Laranja e flor de laranjeira no primeiro embate, pêssegos, nectarinas e damascos de seguida, passando por ligeiros e elegantes fumados e terminando com notas intensas de pedra molhada, revelando o seu enorme caracter mineral. A sua boca é absolutamente perfeita, revelando a presença de fruta de enorme qualidade, uma madeira delicadíssima e muitíssimo bem integrada, uma acidez al dente e um final longo e persistente. Não tenho receio nenhum de assumir que considero este MIRABILIS 2017, um dos melhores vinhos brancos nacionais de sempre!

QUINTA NOVA REFERÊNCIA 2016 (PVP +/- 50€)

Vinho produzido a partir da casta Tinta Roriz (75%) e Vinhas Velhas (25%). Nariz delicado, onde a fruta vermelha e algumas notas especiadas predominam. Notam-se, efectivamente, evidentes sensações de noz moscada, tomilho e pimenta preta. Na boca revela uma estrutura e um vigor, que se conjugam na perfeição com a clareza da fruta, a integração das notas fumadas e a acidez adequada. Elegância e equilíbrio são os dois adjectivos que melhor descreverão este vinho, com um final longo e persistente.

QUINTA NOVA GRANDE RESERVA 2016 (PVP: 50€)

Vinho onde impera a casta Touriga Nacional (75%) e Vinhas Velhas (25%). Mais fresco que o anterior, apresenta também uma maior definição aromática, com notas florais em evidência, cravinho e alguma fruta preta como mirtilos e amoras. Um vinho vivo, fresco e complexo. A elegância perdura na boca, onde uma textura sedosa é depois acompanhada por uma excelente acidez. Redondo e equilibrado, concentrado e fino, terminada de forma longa e focada.

Foi um privilégio ter podido participar na apresentação à imprensa destes vinhos, sempre acompanhados de notáveis iguarias e num espaço que deixa belíssimas memórias. Num mundo e sector cada vez mais competitivos, não basta saber fazer vinhos, é preciso também saber comunicá-los! Bravo Luísa Amorim –You Rock!

Olga Cardoso

*Texto inicialmente publicado no site Wine & Stuff

VINHAS DA IRA
VINHAS DA IRA – Um ícone desconhecido !?

Os  vinhos VINHAS DA IRA são produzindos nas terras quentes do Baixo Alentejo, bem perto da cidade de Beja, que se encontra a Herdade da Mingorra. Propriedade de enorme beleza, com cerca de 1400 hectares de extensão total, várias bacias hidrográficas e uma fauna diversificada, da qual se destacam as muitas perdizes que por lá proliferam e parecem conviver harmoniosamente com as demais espécies animais e vegetais. A Herdade da Mingorra é realmente uma terra de perdizes.

A sua condução está hoje nas mãos da segunda geração, nomeadamente da Sofia e da Maria Uva, que acabam por ser os rostos da empresa. Sendo uma propriedade enorme e de grande beleza, que produz amêndoa, azeite, mais de 1 milhão de garrafas de vinho, distribuídas actualmente por 17 referências, para além de se encontrar já aberta a programas de enoturismo, irá dar certamente lugar a um ou mais artigos meus no futuro.

Contudo, o intuito agora é falar-vos do topo de gama deste projecto vínico e que dá pelo nome de Vinhas da Ira. A Mingorra possuí hoje certa de 200 hectares de vinha, entre as quais se encontram algumas das mais antigas da região. Entre os talhões mais antigos, muitos sofreram re-enxertias aquando a reestruturação das vinhas, para castas mais actuais que se enquadrassem no perfil de vinhos pensados para a nova vaga dos vinhos da Herdade da Mingorra, aproveitando a qualidade dos solos de xisto vermelho e a sua baixa produtividade – à excepção, claro, do talhão 25, de onde se produz este topo de gama – Vinhas da Ira. Este talhão, plantado em solo argilo-calcário e registado como Alfrocheiro, viria a revelar-se único aquando da descoberta de que o Alfrocheiro, efectivamente, não era mais do que uma minoria entre mais de doze castas distintas, muitas delas nunca identificadas. Dentro das identificadas, predominam o Aragonez, o Alicante Bouchet e a Touriga Nacional.

O vinho tem nome de romance e, de facto, há algo de “romântico” na sua génese. Em tempos idos, confrontado com a vontade de outros intervenientes no levantamento ou destruição destas vinhas tão pouco produtivas, Henrique Uva, o titular e mentor deste projecto, tudo fez para que estas vinhas fossem mantidas. Foi a força da sua convicção, o resultado da sua “ira”, que permitiu a existência deste vinho, cujo único defeito, para mim – claro está! – é o facto de não poder ser produzido em maiores quantidades. A vinha não é grande e a sua rentabilidade é obviamente baixa.

Nunca são produzidos mais de 4000 ou 4500 kg de uvas, que apenas em anos considerados com a qualidade necessária para o efeito, dão lugar ao engarrafamento de cerca de 3000 garrafas. A primeira edição deste vinho data de 2004 e o último a sair para o mercado foi o de 2014. As colheitas provadas para este artigo foram as de 2004, 2011 e 2014.

Antes de falar sobre esta prova e estes vinhos, gostaria de deixar aqui umas palavras sobre o enólogo que os faz. Trata-se do Eng. Pedro Hipólito, um tripeiro nascido no magistral ano de 1970, que, ao que parece, se terá “alentejado” para todo o sempre! Talvez mais conhecido por ser o enólogo da Adega do Redondo, a verdade é que o Pedro está com a Mingorra desde o primeiro momento.

Nos últimos anos, tornou-se também responsável por toda a parte agrícola, com maior participação na viticultura naturalmente. Sem ignorar a componente prática e económica da produção de vinhos, a verdade é que o Eng. Pedro Hipólito é essencialmente um homem da ciência e do campo, áreas onde ajuda a crescer todos os projectos em que se envolve. Não lhe peçam é para viver nas luzes da rivalta. O Pedro parece fugir dos holofotes com tanta rapidez como alguns dos seus congéneres os procuram. Esta característica muito low-profile, não faz dele um enólogo muito falado, nem mesmo muito conhecido. Contudo, sempre que penso em enólogos como o Pedro Hipólito, lembro-me imediatamente de umas palavras que me foram ditas há uns anos pelo meu amigo Osvaldo Amado. “Um grande enólogo não se vê pelos luxuosos vinhos de nicho que produz. Gerir umas quantas barricas estará sempre ao alcance de qualquer um. Difícil mesmo é fazer volume e qualidade ao mesmo tempo. É gerir diferentes projectos, alguns milhões de litros de vinho e, ainda assim, conseguir apresentar ao mercado vinhos de grande qualidade.” E isto é o que o Pedro Hipólito faz com todo o mérito. Parabéns meu caro conterrâneo!

Tendo já provado o Vinhas da Ira 2014 (última colheita produzida e a única disponível no mercado) várias vezes e com várias pessoas, isto apesar do vinho só ter saído para o mercado há cerca de 6 meses, tenho sido confrontada com algumas observações que na minha opinião pecam por prematuras. A maioria diz que o vinho está muito fechado, pouco expressivo, muito tânico ou com taninos ainda muito duros. Concordo que existem ainda arestas a limar e que o vinho irá crescer em cave, mas quem diz isso não sabe o que é um Baga clássico da Bairrada, não sabe o que é um Ramisco de Colares e também não saberá o que é um grande Bordéus do Haut-Médoc. Todos estes vinhos precisam de tempo, muito tempo mesmo – para quem gosta de vinhos mais macios! Quem os conhece e sabe apreciar, sabe que só atingirão o seu auge ao fim de algum tempo em garrafa, tempo esse que dependerá da região em particular, das castas e até da colheita em causa.

Mas por acaso nem sequer é o caso deste Vinhas da Ira 2014. Está ainda jovem é certo, mas para quem, como eu, apreciar nervo, robustez e a sensação de taninos bem presentes para harmonizar com um belo prato de carne, terá nele um belíssimo parceiro à mesa. Para além disso, quem o comprar, poderá ficar seguro de que adquiriu um vinho de guarda com vários anos de vida pela frente.

Afinal quais são os factores que determinam ou poderão determinar a longevidade de um vinho? Basicamente são quatro: Acidez, taninos, álcool e açucar. Pois este vinho tem isso tudo, com excepção naturalmente do açucar já que não se trata de uma colheita tardia, nem de um vinho fortificado. Até a questão do PH (a sigla é francesa e significa pouvoir hydrogène) é importante para o envelhecimento de um vinho. Um tinto com um PH na casa dos 3,5, dá-nos algumas garantias de longevidade ou de um bom envelhecimento em garrafa. O álcool cifra-se nos 14% graus, a acidez é de 6,3 g/l e os taninos estão bem presentes e mostram-se em devida forma. Então porquê dizer mal deste vinho?!…

Os vinhos foram provados no dia 12 de Março de 2019. Por engano foi aberta uma garrafa do Vinhas da Ira de 2004. A intenção era abrir um 2009. Por duas razões:

  1. Em termos cronológicos faria mais sentido comparar 3 colheitas mais próximas – 2009, 2011 e 2014;
  2. A garrafa de 2004 aberta era a última que possuía e eu ando a tentar seguir o rasto e avaliar a longevidade dos vinhos de Beja. Não só da Mingorra, mas também dos outros produtores.

O facto dos rótulos do 2004 e do 2009 serem iguais (acho que só difere mesmo a cápsula), dos números 4 e 9 serem parecidos e da minha visão ao perto já não ser o que era, determinaram este engano. Como a prova não foi feita em minha casa, já não havia forma de corrigir a situação. Assim, lá fiquei eu com um 2009 para abrir mais tarde e, felizmente, tive a sorte de encontrar uma garrafa do 2004 perdida numa garrafeira perto de mim. Tudo novamente em ordem, portanto!

O PVP aconselhado deste vinho (Vinhas da Ira 2014) é de 25€, sendo normal vê-lo entre os 24€ e os 28€, dependendo da garrafeira. Os rótulos das garrafas foram mudando ao longo tempo, sendo que o meu preferido é o do Vinhas da Ira 2011. Mas isso é uma mera questão de pormenor. Na realidade todos me agradam.

O título deste artigo é um bocadinho ou totalmente antagónico. Ícone desconhecido?! Isso na realidade não existe. Se é ícone ou icónico, é forçosamente conhecido e reconhecido. A minha intensão foi mesmo a de provocar e de criar um frisson. Em primeiro lugar, tem por objectivo chamar à atenção dos leitores que estão perante um excelente vinho e em segundo lugar (e não menos importante), visa chamar à atenção de quem de direito, para passar a olhar para este vinho de outra forma, para lhe passar a conceder o mérito devido e o começar a incluir em tudo o que são provas oficiais sobre – ÍCONES DO ALENTEJO!

Termino este já longo artigo com a minha nota de prova pessoal sobre os 3 vinhos/colheitas provados.

VINHAS DA IRA 2014 (único disponível no mercado)

Mostrando ainda um nariz algo fechado, pouco comunicativo, a verdade é que este field blend revela já notas de frutos vermelhos muito maduros, um toque balsâmico e ainda uns ligeiros fumados, muito suaves, mas que compõem o conjunto final. É um tinto austero, com taninos bem presentes e que provado sem comida até poderá deixar uma secura no final de boca. Para acompanhar um belo prato de caça, já se mostra pronto, fazendo uma maridagem perfeita.

Com tanino de tanta robustez e qualidade, uma belíssima acidez e uma frescura notável para um vinho de Beja, este tinto só poderá auspiciar a uma longa vida em cave. Tem todo o nervo e todo o potencial para isso. Atendendo ao preço e à sua qualidade, considero ser um vinho para se comprar às caixas. Eu já tenho as minhas!

VINHAS DA IRA 2011

Um vinho ímpar de um ano memorável para o país. Com mais de 8 anos de vida, a complexidade deste vinho é já muito evidente. Evoluiu brilhantemente. Consegue combinar concentração e potência, com elegância e sofisticação. Não é fácil um vinho conseguir conciliar todas estas características. Tudo impressiona neste vinho. Tem uma acidez vibrante, um tanino fino, uma frescura elegante, mas sobretudo uma imponência que não deixará ninguém indiferente. Estas serão efectivamente as características mais patentes neste vinho – imponência vs elegância. Em suma, todo o requinte que um grande tinto pode proporcionar.

VINHAS DA IRA 2004

Ainda que aberto sem intenção, a verdade é que este 2004 me deixou muito contente. Eu que ando a tentar perceber a longevidade dos vinhos de Beja, já me tenho deparado com algumas desilusões, mas também com algumas boas surpresas. Este 2004 foi, felizmente, uma dessas alegrias. De cor ainda muito intensa para os anos de vida que possui, obviamente que a púrpura deu lugar a um vermelho rubi mais aberto com rebordos acastanhados. As notas de oxidação no nariz faziam-se sentir de forma muito suave, conferindo complexidade ao conjunto. Muito vivo ainda, não deixava os efeitos do tempo esmagarem a fruta. Os seus aromas primários ainda se faziam sentir, sendo, contudo, as notas balsâmicas e terrosas que imperavam. Tinha força, tinha garra, proporcionou uma prova de muito prazer e deu sinais de ter ainda alguns anos de vida pela frente e em perfeito estado de saúde. Bom ver vinhos assim!

Por último, e uma vez que não chegamos a provar o VINHAS DA IRA 2009, pelas razões que já acima referi, gostaria de informar que provei a colheita de 2009 em 2017 e recordo-me de considerar que o vinho estava num excelente momento de consumo. No entanto, não disponho aqui da nota de prova que fiz na altura para a poder partilhar. Contudo, e porque está disponível no facebook, gostava de partilhar aqui uma foto/artigo, a título de curiosidade, para todos quantos se mostram mais cépticos sobre as valias do Vinhas da Ira, enquanto “ícone” Alentejano.

Luis Sottomayor, enólogo director da Sogrape, homem que tem sobre as suas costas, entre outras coisas, a decisão de declarar um vinho Barca Velha ou não, a uma pergunta colocada pelo Pedro Garcias para o Jornal Público sobre qual o seu vinho alentejano preferido, respondeu, à época – VINHAS DA IRA 2009.

Vale o que vale dirão alguns, mas eu tenho cá para mim que valerá alguma coisa. Deixo-vos então uma foto do texto para o poderem ler.

Cheers!

Olga Cardoso

*Texto inicialmente publicado no site Wine & Stuff

Caiado(s) de fresco

Situada em Campo Maior, fica a Adega Mayor de onde nos chegam estas três referências da marca Caiado, que funcionam como entrada de gama do referido produtor. Apresentaram-se na última colheita (2015) com uma nova roupagem, pelo que se pode dizer que estão caiados de fresco. Disponíveis em tinto, rosé e branco, são vinhos onde a fruta é dona e senhora de todas as atenções. Destaca-se essencialmente a cuidada imagem, mas acima de tudo a qualidade que nos apresentam no copo é digno de realce. Todos eles são frescos, alegres e de perfil bem gastronómico, a pedirem mesa e companhia à sua volta.

Caiado logo

Logo – Foto de João Pedro Carvalho| Todos os Direitos Reservados

O Caiado branco 2015 feito a partir do lote das castas Antão Vaz, Arinto e Roupeiro, apenas com passagem por inox o que é algo que em termos de vinificação os mete todos no mesmo patamar. Depois são os aromas frescos e maduros, limpos, de uma fruta muito sumarenta e perfumada. A acidez dá a frescura suficiente para lidar com os mais triviais petiscos que nos surjam à mesa e porque não as Sopas de Cação ou uma Caldeta do Rio, tem estofo para tal e o problema é em conseguir ter garrafas suficientes para todos aqueles que se juntem à nossa mesa.

No interlúdio entre peças, diga-se pratos, abrimos o Caiado Rosé 2015 que é filho das castas Aragonês, Castelão e Touriga Nacional. Mudam os aromas e muda o tom, mudamos pois para os morangos, amoras e ameixa, tudo maduro e com um toque guloso de rebuçado. Picamos uma rodela de chouriço frito, depois mais outra, agora um bocadinho de farinheira sem problemas que o vinho aguenta pois tem frescura suficiente para tal. Damos conta e temos à frente umas Sopas de Tomate com Capelas, este Rosé como bom Alentejano porta-se à altura e quando damos conta no final nem Sopas nem vinho.

Caiado vinhos

Vinhos– Foto de João Pedro Carvalho| Todos os Direitos Reservados

Aguardamos então, com o Caiado tinto 2015 no copo, pelo próximo prato. Este tinto criado a partir do lote Aragonês, Trincadeira e Alfrocheiro mostra o lado mais morno da planície, sem por isso ter a sua dose de frescura e candura. Afinal de contas as Burras de Porco Preto tinham sido lentamente estufadas, ou direi caiadas, por este tinto. Uma combinação perfeita com o vinho a mostrar ter estrutura e frescura suficientes para a empreitada.

Texto João Pedro de Carvalho

Herdade do Mouchão, Tonel 3-4 2011

Ouvir falar em Herdade do Mouchão é lembrar no imediato de grandes vinhos que têm vindo a deliciar gerações de apreciadores, o seu nome teve a capacidade de se afirmar com o passar dos anos num dos ícones indiscutíveis do Alentejo, um vinho que faz parte do desejo de qualquer enófilo e é sem dúvida alguma um dos grandes produtores a nível nacional. A sua história da Herdade do Mouchão começa por volta do ano de 1825, quando o inglês Thomas Reynolds se instala no Porto como negociante de Vinho do Porto, três gerações passaram e o seu neto, John, envolveu-se no negócio da cortiça e comprou um número razoável de propriedades no Alentejo. A Herdade do Mouchão foi uma dessas herdades, com 900 hectares em que 70% são ocupados por montado de sobro. Do negócio da cortiça cedo se expandiu para o vinho,  plantou-se vinha (onde viria a surgir a Alicante Bouschet em Portugal) com a respectiva adega a ser construída entre os anos de 1901 e 1904. Com o passar dos anos a produção de vinhos foi sendo aperfeiçoada e seria na década de 50 que a marca Mouchão iria surgir no mercado pela primeira vez (1954), mantendo-se na mesma a produção de vinho a granel. Naquela altura a área de vinha já tinha sido aumentada, as vinhas de Alicante Bouschet trazidas de França seriam responsáveis por alguns vinhos míticos, tinha nascido no Alentejo um dos grandes produtores de vinho. Após o 25 Abril de 1974 a Herdade foi expropriada e tomada pela “Cooprativa 25 de Abril” da Casa Branca, apesar dos seus proprietários nunca terem abandonado a sua casa, a Herdade do Mouchão e a Adega apenas seriam devolvidos em 1985 num estado degradado e com grande parte das vinhas a terem deixado de produzir com outra tanta parte arrancada e substituída por outras variedades de maior rentabilidade, a grande maioria dos stocks dos melhores e mais antigos vinhos tinha sido vendida ao desbarato. Naquela altura foi necessário começar do zero, a vinha velha teve de ser arrancada, replantada e reformulada. Nos dias que correm, um século depois da sua fundação, a Herdade do Mouchão continua em plena forma e na posse da família Reynolds.

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Herdade do Mouchão – Foto de João Pedro Carvalho| Todos os Direitos Reservados

Da Vinha  à Adega e a Vinificação

A vinha nos seus 38 hectares totais é composta por várias parcelas espalhadas pela Herdade do Mouchão, as vinhas da Dourada, das Canas, a Vinha Nova das Canas, da Barragem, a Vinha do Mouchão Velho e a mais especial de todas a Vinha dos Carapetos onde mora a parcela mais antiga de Alicante Bouschet. Nas restantes parcelas os encepamentos variam entre Trincadeira, Aragonez, Touriga Nacional, Touriga Franca, Castelão e Syrah,  nos brancos o Antão Vaz, Arinto e Perrum. No Mouchão a tradição fala mais alto, ainda bem para os consumidores, os vinhos mantém um cunho muito próprio fruto de um apurado terroir e de cepas de Alicante Bouschet muito velhas. Adega singela e cheia de carisma onde tudo parece imaculado com os seus imponentes e velhos toneis de madeira ( Mogno, Castanho, Carvalho e Macacaúba)  e algumas pipas mais velhas a recordar que o tempo é inquilino daquela casa vai para mais de 100 anos, ali mesmo onde a família de adegueiros se mantém há três gerações, guiados por Iain Reynolds Richardson o actual proprietário, num garante de que o saber fazer se vai mantendo ao longo dos anos e não se vira costas aos saberes do antigamente. A uva é escolhida e vindimada manualmente, transportada para a adega onde é esmagada e fermentada com os engaços nos nove lagares de pedra ali existentes. A pisa a pé é efectuada para todos os vinhos tintos do produtor, caso raro por terras do Alentejo, depois de fermentado o vinho é trasfegado para os tonéis que variam entre os 2.500 e 5000 litros de capacidade, onde efectua a maloláctica e onde estagia por períodos que variam entre os 4 e os 7 anos. Parte dos vinhos estagia também em barricas de carvalho francês de 225 litros. Em jeito de curiosidade no pico do Verão quando as temperaturas são mais elevadas, o adegueiro por volta das 6 da madrugada abre todas as janelas da adega com o objectivo de refrescar o local, sendo que por volta das 9 horas todas as janelas voltam a ser fechadas de forma a preservar ao máximo a temperatura interior. A enologia está a cargo do Enólogo Paulo Laureano.

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Vinha – Foto de João Pedro Carvalho| Todos os Direitos Reservados

Alicante Bouschet

Falar-se na Herdade do Mouchão é ter de falar na casta vinda de França de seu nome Alicante Bouschet, que se instalou ali pela primeira vez na Vinha dos Carapetos e seria ali naquele fantástico e mágico local que daria o tiro de partida para aquilo em que se transformou nos dias de hoje, a grande casta do Alentejo. Da mal-amada por França a glorificada no Alentejo, a casta que se adapta a climas quentes e que foi menosprezada pelos Franceses, de tal forma que quando os Rothchild compraram a “Quinta do Carmo” nos anos 90, decidiram de forma pouco inteligente destruir todas as vinhas velhas de Alicante Bouschet que esteve na origem dos grandiosos vinhos da marca. Como casta é tintureira, polpa e sumo escuros, criada em laboratório por um professor de viticultura francês de nome Henri Bouschet, ao cruzar Grenache e Petit Bouschet em 1865, não muito depois viria para o Alentejo brilhar. Casta vigorosa que produz vinhos intensos e bem estruturados de grande longevidade, fruto da boa acidez e dos taninos que mete à disposição. De aromas a lembrar frutos silvestres, azeitona, especiado e vegetais, travo de bálsamo marca todos os tintos.

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Vinhos – Foto de João Pedro Carvalho| Todos os Direitos Reservados

Vinhos com história

A determinada altura na Herdade do Mouchão, quando a superfície total de vinha era superior ao actual, nem sempre se conseguia vender toda a produção. Desta forma os vinhos que não se vendiam iam ficando armazenados e a determinada altura verificou-se que aqueles vinhos ganhavam com um estágio prolongado em adega. Na realidade o primeiro Mouchão engarrafado veria a apenas a luz do dia em 1949 seguido do 1954 e o 1963. O que aconteceu pelo meio desapareceu com a ocupação da Cooperativa Agrícola 25 de Abril. Apesar de tudo isto, a gama de vinhos tem vindo a ser aumentada com o passar dos anos, o primeiro vinho e o que goza de maior prestígio é o Mouchão, já teve na sua altura a edição em branco mas foi descontinuado, hoje só mesmo tinto, onde brilha o duo Alicante Bouschet com Trincadeira. Depois surgiu em 1990 o Dom Rafael, o nome homenageia o primeiro proprietário da Herdade do Mouchão, tal como o Dona Cristina que homenageava a sua esposa. Foi já em 1996 que aparece o vinho mais especial da casa, o Mouchão Tonel 3-4 assente numa base das melhores uvas de Alicante Bouschet. Em 2005 surge o mais moderno Ponte das Canas. Os anos de 1994 e 1995 foram trágicos com a geada a dizimar por completo a produção.

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Tonel Nº3 – 4 – Foto de João Pedro Carvalho| Todos os Direitos Reservados

Mouchão Tonel nº 3-4 2011

Em anos de colheitas excepcionais e comprovada a sua qualidade, a equipa de enologia da Herdade do Mouchão reserva cerca de 10 mil litros de vinho nos famosos tonéis 3 e 4, de carvalho português, macacaúba e mogno, onde estagia durante 36 meses. O Herdade do Mouchão Tonel Nº 3-4 2011 é um vinho que carrega a responsabilidade de respeitar a casta e a tradição em anos excepcionais. Pleno de garra, profundidade e complexidade, é produzido a partir de uma cuidada selecção de uvas Alicante Bouschet provenientes da emblemática Vinha dos Carapetos, berço da casta em Portugal.

É um verdadeiro colosso que como poucos tem a capacidade de vergar autênticas plateias de apreciadores. A potência surge aliada a uma finesse que lhe assenta que nem uma luva de cetim, musculado mas bem torneado, de aromas limpos e cintilantes, enorme a fruta (bagas silvestres) bem madura e suculenta envolta em aromas de eucalipto. De copo na mão somos transportados para a Vinha dos Carapetos, de perfil amplo, profundo, com uma frescura que percorre todos os recantos. A complexidade cresce com o tempo que passa no copo, sem nunca largar aquele ligeiro terroso lá no fundo.

Texto João Pedro de Carvalho

Meruge, o charme da Lavradores de Feitoria.

As mais recentes colheitas do vinho Meruge, branco e tinto, foram recentemente apresentadas na Taberna da Rua das Flores. Esta marca criado pela Lavradores de Feitoria (Douro), teve direito a uma vertical de cinco tintos e cinco brancos, com a respectiva palestra dada pelo enólogo responsável, Paulo Ruão. ‘Meruge’ é um peculiar e “sonante” nome na história da Lavradores de Feitoria, começou por ser o nome de uma das 19 quintas que compõem o portefólio da empresa – Quinta da Meruge, situada no concelho de São João da Pesqueira e que assim se chama porque ali habitam, entre vinhas, muitas ervas silvestres com esta designação (aka morugem) –, mas rapidamente passou da vinha ao vinho! Em 2001 a Lavradores de Feitoria lançava os seus primeiros “vinhos de quinta” e, um deles, era precisamente o ‘Quinta da Meruge’, um tinto de 1999, que se repetiu nas colheitas de 2000 e 2001. Estávamos em 2005 quando a Lavradores de Feitoria lançou o seu primeiro “vinho de terroir”, um tinto da colheita 2003 a envergar precisamente o nome ‘Meruge’. Mais tarde, na vindima de 2009 nascia o ‘Meruge branco’.

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Vinhos Brancos – Foto de Ricardo Bernardo| Todos os Direitos Reservados

Sendo o ‘Meruge branco’ um Douro feito com Viosinho em estreme pode, a certo ponto, assumir-se que a sua história – ou gestação – remonta à vindima de 2007. Neste ano, a equipa técnica da Lavradores de Feitoria identificava um Viosinho de excelência, nascido de vinhedo com mais de 45 anos e que permitia a sua vinificação a solo. Considerada uma das melhores castas autóctones do Douro e Trás-os-Montes deu origem ao ‘Três Bagos Viosinho’, nas colheitas de 2007 e 2008. Um néctar que em 2009 evoluiu – e assim se manteve – para um caminho diferente: ao estagiar em madeira “deu salto” para a gama ‘Meruge’. Um chamado “branco de Inverno” que tem a particularidade de fermentar e estagiar seis meses em barricas de carvalho português, de Palaçoulo, novas e em cru – sem “queima/tosta” –, o que lhe imprime um carácter muito próprio. O desfile começou nos brancos e com cinco referências, desde 2010 ao novíssimo 2015 que será colocado no mercado no início do ano que se aproxima. Notável a frescura e limpeza de aromas que todos mostraram, num fio condutor comum a todos eles, permitindo entender como aromas e sabores iam evoluindo na passada do tempo.

Meruge branco 2015: Desde o mais novo ao mais velho, a barrica onde estagiaram nunca lhes chega a marcar a alma e o corpo, nota-se ligeiramente mas sem os tradicionais fumados, mesmo no exemplar mais recente. É comum a todos eles uma bonita e perfumada complexidade, enorme elegância com muitos aromas de cariz citrino, floral acompanhado de folha verde, ligeiro toque de madeira quase que acetinado no fundo. Na boca faz-se notar uma muito boa frescura que sempre presente, alarga para sabores de fruta bem fresca e ácida, boa estrutura com suporte na acidez e num fundo de sensação mineral. A guardar algumas se entretanto conseguir resistir aos seus encantos.

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Vinhos Tintos – Foto de Ricardo Bernardo| Todos os Direitos Reservados

No que aos tintos diz respeito, a Quinta da Meruge apresenta características muito especiais, principalmente na casta Tinta Roriz, plantada uma vinha de encosta virada a Norte. Um desafio para a equipa de enologia da Lavradores de Feitoria, que na vindima de 2003 encetou uma forma de vinificar distinta, a fim de dar origem a um tinto – de seu nome ‘Meruge’ – com características do Douro, embora mais suave e elegante. O lote – de Tinta Roriz (80%) e Vinhas Velhas (20%), com predominância de Touriga Franca e Touriga Nacional – estagia em barricas novas de carvalho francês.

Meruge tinto 2014 é aquilo a que se pode chamar, vinho de charme, com a Tinta Roriz a brilhar bem alto dando origem neste caso a um vinho de perfil mais Borgonhês. Um belíssimo vinho que como ficou provado, desenvolve uma fina complexidade na passada larga do tempo, não seja de estranhar a maneira como se mostra na fase mais jovem com ligeiro aroma terroso, mato rasteiro, cogumelos e especiaria, dando lugar a uma fruta bem ácida e marcante com chocolate e especiaria. Com muito boa presença na boca deixado pela fruta (cereja ácida) suportada por uma estrutura firme, com frescura, passagem saborosa e marcante. Uma belíssima aposta que irá ganhar com alguns anos de cave.

Texto João Pedro de Carvalho

Os Muros de Anselmo Mendes

Anselmo Mendes é nome maior da enologia Portuguesa, nasceu e cresceu em Monção e foi aí que desde criança se familiarizou com a cultura da vinha e a produção do vinho. Um verdadeiro mestre da enologia que trata a casta Alvarinho com uma precisão e rigor, como poucos o sabem fazer no mundo. Fruto do seu trabalho a partir de três castas e em três das zonas da Região Demarcada dos Vinhos Verdes: Alvarinho no Vale do Minho, Loureiro no Vale do Lima e Avesso no Vale do Douro, nascem os seus vinhos. Um artigo dividido em duas partes, numa primeira parte dedicada aos cinco exemplares designados como Muros, desde o Escolha, passando pelos varietais até ao topo Muros de Melgaço. São cinco os Muros, todos distintos mas com identidade muito própria, a transmitirem aquilo que de melhor as castas e os locais de origem têm para nos dar.

vinha Anselmo Mendes

Vinha – – Foto de João Pedro Carvalho| Todos os Direitos Reservados

Muros Antigos Escolha 2015: Nasce da selecção das castas Alvarinho, Loureiro e Avesso. Aroma muito coeso e limpo, de fino recorte cheio de fruta (tropical, citrinos, pomar) com bela frescura. Na boca mostra-se cheio de sabor, leveza com acidez vincada a prolongar um final com ligeira secura.

Muros Antigos Avesso 2015: Proveniente de uvas criadas no Vale do Douro, em Baião, com vinhas em altitude acima dos 500m. Muito preciso de aroma, fresco e mineral com a fruta (citrinos maduros) presente sem grande exaltação. Boca a mostrar um conjunto com muita energia, fruta bem presente com final onde se sente um ligeiro travo mineral.

Muros Antigos Loureiro 2015: Uvas da casta Loureiro criadas no Vale do Rio Lima. Muito bem no aroma a invocar a casta, perfumado (floral) com toque de folha verde de louro, citrinos, todo ele muito preciso, fresco e elegante. Replica no palato, apoiado numa bela acidez, acutilante e expressivo num misto de energia e finesse.

Muros Antigos Anselmo Mendes

Muros Antigos – Foto de João Pedro Carvalho| Todos os Direitos Reservados

Muros Antigos Alvarinho 2015: A casta Alvarinho de vinhas junto ao rio, em solos com elevado teor de pedra rolada. Muito limpo de aromas, mostra-se bem fresco com notas de fruta bem madura (tropical ligeiro, tangerina), flor de laranjeira, com um ligeiro toque a noz que lhe confere a sensação de ter alguma untuosidade. Na boca mostra-se com bom corpo, bem estruturado e a mostrar-se bem comunicativo, comandado pela fruta cheia de frescura e sabor.

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Muros Antigos, Alvarinho – Foto de Anselmo Mendes| Todos os Direitos Reservados

Muros de Melgaço 2014: Uvas da casta Alvarinho, exclusivamente produzidas em Melgaço. Fermenta e estagia em barricas de carvalho francês durante 6 meses. Um clássico e aquele que durante anos foi o topo de gama do produtor. Um vinho onde predomina a elegância de conjunto com uma fruta (citrinos com ligeiro toque tropical) lado a lado com uma mineralidade muito fina e delicada.

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Muros de Melgaço – Foto de Anselmo Mendes| Todos os Direitos Reservados

Notas de pederneira num vinho que mostra ter uma bonita complexidade, que irá aumentar com o passar dos anos em garrafa, mas que dá uma excelente prova desde já. Boca com grande finesse e equilíbrio, frescura acompanhada pela fruta e um final de travo seco e mineral. Um grande vinho.

Texto João Pedro de Carvalho

Encontros com o Vinho e Sabores da Bairrada

Em mais uma excelente organização da Revista de Vinhos, tiveram recentemente lugar os quartos Encontros com o Vinho e Sabores da Bairrada. Foram utilizadas as belíssimas instalações do Velódromo de Sangalhos e do Museu do Vinho da Bairrada, em Anadia. Foram três dias intensos, entre provas nos stands dos vários produtores bairradinos ali presentes, visitas a algumas quintas e provas comentadas muito interessantes. No primeiro dia foi a visita ás caves de Sidónio de Sousa, um clássico bairradino. Depois duma rápida visita á adega, já a rebentar pelas costuras e a aguardar a inauguração dum novo pavilhão, foi servido um almoço pelo restaurante Magnum, com um polvo excelente como prato principal, acompanhado por alguns dos belíssimos espumantes e tintos da casa. O tinto Baga 1991 continua num nível superior, sedoso, elegante, estruturado, um belo vinho. Da parte de tarde na prova comentada de vinhos, já no Velódromo, João Paulo Martins presenteou-nos com 12 vinhos de sua escolha, com a particularidade de provarmos quatro brancos completamente diferentes, a provar a potencialidade da região para fazer vinhos tão diversos e sedutores.

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Vinhos – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Á noite, no Velódromo, o jantar foi servido pela Nova Casa dos Leitões. Depois de alguns petiscos e entradas, os leitõezinhos, saídos do forno, perfilaram-se para serem trinchados a preceito.

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Leitões – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

No segundo dia foi a visita ás Caves Messias, na sua Quinta do Valdoeiro. Ali pudemos ver uma grande extensão de vinha e uma parcela de Baga carregada de cachos e cuja vindima estava programada para…12 de Outubro, muito para lá do equinócio. Sinais dos tempos! Um almoço divertido e variado, com carnes grelhadas em rodízio, teve a companhia de vários vinhos da casa, com algumas novidades já no mercado, com destaque para o Valdoeiro Reserva Branco 2010 e o espumante Messias Grande Reserva Baga Bairrada 2012 com um perfil duma extrema elegância.

Á tarde foi a vez duma prova comentada pelo Luis Lopes, no Museu do Vinho da Bairrada, com uma viagem fantástica por mais de 20 vinhos tintos, em que foram confrontadas as colheitas de 1991, 2001 e 2011. Viagem inebriante, variada, saborosa e muito esclarecedora do que são, como estão e que potencialidade têm estes tintos fantásticos. O Luis Lopes no seu melhor. No fim, brindamos com espumante, claro! Á noite o jantar foi servido pelo restaurante Sal Poente, num delicioso passeio por várias receitas de bacalhau. Sempre na companhia de vinhos da Bairrada.

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Prova de vinhos – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

A última visita foi á Quinta de Baixo, na Cordinhã, agora dum homem do Douro mas apaixonado pela Bairrada e um dos fundadores dos Baga Friends: Dirk Niepoort.

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Quinta de Baixo – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

Uma velha paixão tornada realidade, com uma excelente equipa de viticultura e enologia, liderada pelo Sérgio, um bairradino de alma e coração. Ali as castas autóctones são acarinhadas e levadas a produzir belos vinhos, embora com um estilo e vários perfis bem diferentes. A visita á adega foi esclarecedora do tipo de trabalho ali efectuado, sempre com enorme paixão, e a grande surpresa foram os vinhos que se provaram directamente das barricas, que estão a estagiar em toneis antigos, alguns com mais de 60 anos de idade, com capacidades a rondar os 1.000 litros, que o Dirk foi comprar á Austria e á Alemanha, e que albergaram durante anos vinhos brancos de algumas das regiões vinícolas daqueles países. Com a particularidade de nunca serem lavados nem queimados, ou seja, de não terem trabalho de tanoaria, o que lhes confere uma “patine”fantástica que vai ajudar a evolução dos seus irmãos bairradinos. O que se provou era excelente, grandes vinhos com o toque do Dirk.

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Dirk Niepoort – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

 

Seguiu-se um almoço em que nos deliciamos com vários petiscos e uma caldeirada de lulas confeccionada pelo próprio Dirk, com alguma ajuda. Com os aperitivos provou-se um espumante que ainda tinha a carica do estágio e foi aberto á la volée ali mesmo á nossa frente, um VV Bical  e Maria Gomes, um bruto natural!! Para além de vários vinhos da Quinta de Baixo, com destaque para o Lagar de Baixo Baga e o Poeirinho Baga, o Dirk não resistiu a abrir um vinho mais velho da quinta e um vinho Barolo italiano. Para a sobremesa, um vinho do Porto, pois claro.

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Vinhos – Foto de José Silva | Todos os Direitos Reservados

E tinha chegado ao fim, mais esta jornada fantástica numa das regiões com mais futuro da vitivinicultura portuguesa…

Texto José Silva

Adega de Sabrosa, o Douro Cooperativo.

Adega de Sabrosa
Numa pesquisa recente que efectuei pelas Adegas Cooperativas que tenho como referência, faltava-me conhecer uma na região do Douro. Faz falta existir em cada região, pelo menos, uma Adega Cooperativa forte e bem implementada que sirva de referência para os consumidores de vinho nacional. Os exemplos noutras regiões são mais que conhecidos do consumidor, a imagem que algumas destas Adegas conseguiram conquistar deve-se à qualidade dos vinhos que colocam no mercado. Será por isso de fácil entendimento, que uma Cooperativa forte e com boa dinâmica de mercado será sempre benéfico para a região.

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Adega de Sabrosa – Foto da Adega de Sabrosa| Todos os Direitos Reservados

Dito isto, resolvi dar um pequeno passeio pelas várias regiões de Portugal, chegando à conclusão que me faltava uma referência na região do Douro no que a Adega Cooperativa diz respeito. Foi então que me foi apresentada a Adega de Sabrosa, fundada em 1958 por um pequeno grupo de viticultores. Fica localizada no concelho de Sabrosa, na sub-região de Cima Corgo e conta nos dias de hoje com 522 sócios. Reformularam recentemente a sua gama que passou a apresentar-se com a marca Fernão de Magalhães, que presta homenagem a Fernão de Magalhães, navegador português natural do Município de Sabrosa, que se notabilizou por ter organizado a primeira viagem de circum-navegação da Terra. A Adega de Sabrosa comercializa também um Moscatel do Douro e Vinho do Porto no qual sobressai o seu Porto 10 Anos.

A prova focou-se na marca Fernão de Magalhães Branco, Rosé, Tinto e o Reserva da Adega de Sabrosa, a enologia está a cargo da enóloga Celeste Marques. Vinhos que lá por fora têm sido bastante apreciados e ganho várias medalhas. O Fernão de Magalhães Branco da colheita de 2015 é um lote das castas Gouveio, Viosinho, Rabigato e Fernão Pires, com passagem por inox. Bem fresco com a fruta (citrinos, frutos de pomar) a saltar no aroma, muito limpo, directo, envolto em perfume floral. Na boca é comandado por uma boa frescura que embala a fruta de médio porte, num bom final. Sem falhas e mais que pronto a ir à mesa a acompanhar por exemplo um arroz de bacalhau.

O Rosé da colheita de 2015 nasce de um lote de Touriga Nacional, Tinta Roriz e Touriga Franca, passagem por inox. Um rosé bem composto, muita fruta vermelha (morango, framboesa) madura e rechonchuda, boa frescura de conjunto que combina com nota de algum rebuçado em segundo plano. Todo ele muito franco e directo, boca com boa frescura onde a fruta se mostra redonda e roliça, com uma ainda que muito ligeira doçura no final, bom companheiro para uns carapaus fritos com arroz de tomate.

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Os vinhos – Foto da Adega de Sabrosa| Todos os Direitos Reservados

Entrando nos tintos da Adega de Sabrosa, o Fernão de Magalhães 2014 resulta do lote das castas Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Roriz. Por aqui dá-se lugar à expressão da fruta, pura e limpa, sem grandes entraves pelo meio ou aromas mais disto ou mais daquilo. Cheira e sabe a vinho do Douro, com aquela nota de esteva presente, leve fumado ao mesmo tempo que a fruta vermelha se mostra bem limpa e suculenta. Na boca é a fruta com boa acidez, mostra-se saborosa e acompanhada pelo travo vegetal também aqui a mostrar-se presente, com uma boa secura final. De perfil muito gastronómico, como é apanágio dos vinhos da região, liga bem com carnes na grelha.

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O Reserva – Foto de João Pedro Carvalho| Todos os Direitos Reservados

O Fernão de Magalhães Reserva 2012 é o topo de gama da Adega de Sabrosa, um lote de Touriga Nacional e Tinta Roriz com passagem por madeira. Um pouco mais concentrado que o anterior, complexidade mediana onde a fruta surge mais fresca e com mais presença, a Touriga Nacional em evidência com bom recorte floral (violetas), especiaria e algum arredondamento com ligeiro cacau morno dado pela passagem por barrica. Boca de médio porte, fresco e com a fruta em bom plano, inicialmente mais macio e convidativo, embala num travo vegetal seco. Uma boa surpresa que fará boa companhia a um cabrito assado no forno.

Texto João Pedro de Carvalho